sábado, 17 de outubro de 2015

Caderno de encargos (8)

A dificuldade não é começar. É continuar. Começar e continuar. Persistir até que comece a fazer sentido, aguentar até que comece a surgir alguma forma da coisa caótica e desprovida de sentido que dá início a tudo. Mas o cansaço surge demasiado rápido. Não me ensinaram a esticar até ao limite as cordas do tecido, a fiar no vazio, sem perceber a partir da trama o resultado a que se irá chegar um dia. E eu nunca aprendi, nem talvez tenha querido a aprender, a fazer mais do que tentar. Admitir que este será talvez o meu maior defeito é dizer pouco. Talvez até nada dizer, sobretudo porque quem me conhece deverá saber quais os piores defeitos. A dificuldade é não continuar e a cada tentativa falhar. E retirar consolo do falhanço, ou pior, de nem tentar. Se nunca chegar ao fim do esforço, da tentativa, posso afirmar que nunca verdadeiramente falhei. Não sei que psicose ou que fracasso se pode chamar a isto. Mas a cada dor, a cada angústia, esta lâmina entra mais fundo. Sangrar continuamente, e ter pena dessa dor a que não consigo fugir. Não poderei ter perdão por ter fugido à tentativa. Um dia imagino poder quebrar o ciclo. Quando será tarde?